
[Apresentação a 12 de Julho (terça-feira), às 18h30, na Buchholz, em Lisboa]
Num país (ou numa era?) feito de azedumes um elogio a alguém arrisca sempre a suspeição de integrar alguma indirecta malvadez a outrem. Não é nem nunca foi este meu caso. Há mais de uma década, desde que fiquei maravilhado com o magnífico “As Duas Sombras do Rio“, o primeiro romance de João Paulo Borges Coelho, que me vou repetindo em cada nova conversa, e tanto que até já extravasei o meu lugar de antropólogo e me botei a escrever uma comunicação sobre o autor [“JPBC: uma geologia ética de Moçambique“].
Repito-me nesta minha opinião, de arrogância maximalista. A de que este autor é, mas de muito longe, a mais interessante, enleante e competente escrita ficcional em português radicada em (sobre) África, o que digo sem o querer acantonar em qualquer “african way of writing” ou qualquer coisa com isso parecido. Tramas romanescas estruturadas, próprias de quem é autor com muita leitura (o que não é regra nesse universo, nem nada que se pareça), é logo algo que o aparta de grande parte desse “meio literário”. Mas há nele muito mais do que isso, uma ficção que ecoa uma análise profunda, complexa, até programática – mas nada a la carte – da sociedade moçambicana, da sua ambivalência, e, por isso, do mundo e dos destinos que este encerra.
Nas personagens e nas temáticas não há ponta desse exotismo, tão populista, que enche páginas de tantos autores africanos, oriundos ou, apenas, austro-cultores, embrulhando boas causas muito de moda. E muito menos no modo que escolhe como seu, tanto que sempre pensei que esse depurar formal, esse “classicismo”, é nele não só uma opção estilística, ou uma “voz” congénita, mas mais uma modalidade de recusa total do tal exotismo, do facilitismo de modos, estilos, temas e ideologias que inundam a literatura afro-centrada. Essa que é radicalmente equivalente àquelas pinturas de ocres e similares, quadros “para turistas” que preenchem as lojas de “curios” dos aeroportos e as paredes de turistas.
Disso resultante é que a sua constante produção literária vai desaparecendo dos escaparates portugueses, mais atreitos à ganga que o mercado da “saudade” – a nostalgia colonial, a nostalgia militante, a nostalgia cooperante, a nostalgia expatriada, a nostalgia turística – vai consumindo, em busca de uma “África” livresca que nada mais é do que o eco da ileitura desses tresleitores.
Digo isto crente que o jpbc segue mergulhado, como sempre, nas suas múltiplas aventuras intelectuais, literárias e outras, sem angústias com esse relativo silêncio que os seus livros vão recebendo (imenso, face ao mérito que têm). Sou eu mesmo, fan, que me arrepelo com isso. É por isso mesmo que continuo a blogar a cada um dos seus livros. A ver se alerto pelo menos uma pessoa a arrancar um dos escaparates (ou das estantes alheias) e a lê-lo.
Na próxima terça-feira, em Lisboa, apresenta-se o próximo. É uma hipótese. Cheguem-se à frente …
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